sábado, 16 de abril de 2011

Ai quem me dera ter outra vez cinco anos




A infância

O menino cantava; sua mãe, no leito, agonizava,
Extenuada, a sua fronte na sombra pendia;
E sobre ela, a morte numa nuvem vagueava;
E eu ouvia a canção e escutava a agonia.

Tinha cinco anos o menino, e junto à janela,
Um claro som de riso e de jogos se erguia;
E a mãe, ao lado da criança doce e bela
Que todo o dia cantava, toda a noite tossia,

A mãe sob as lajes do claustro foi dormir;
E o menino voltou a cantar…
A dor é um fruto que Deus não faz surgir
Num ramo frágil demais para o suportar.


Paris, Janeiro de 1835
Victor Hugo, Poemas, Assírio & Alvim
(Tr. Manuela Parreira da Silva)

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Qual é o fim de tudo ?




Qual é o fim de tudo ? a vida ou a tumba ?
A onda que nos sustém? Ou a que nos afunda ?
Qual a longínqua meta de tanto passo cruzado ?
É o berço que embala o homem ou é o seu fado ?
Seremos aqui na terra, nas alegrias, nos ais,
Reis predestinados ou simples presas fatais ?

Ó Senhor, responde, responde-nos, ó Deus forte,
Se condenaste o homem apenas à sua sorte,
Se já no presépio o calvário se anuncia
E se os ninhos sedosos, dourados pela manhã fria,
Onde as crias vêm ao mundo por entre flores,
São feitos para as aves ou para os predadores.

24-3-1837
Victor Hugo, Poemas, Assírio & Alvim
(Tr. Manuela Parreira da Silva)